domingo, 30 de setembro de 2007

Notícias da Rua Judaica, por Osias Wurman

Caro Osias,
Obrigada por divulgar aos seus leitores o tombamento do Cemitério Israelita de Inhaúma (
http://www.owurman.com/blog/). Um fato tão importante que não mereceu uma nota da Federação Israelita do Estado do RJ (FIERJ)...
O tombamento do cemitério não é inesperado. Aquele campo-santo está ausente de uma ação efetiva da FIERJ. Na década de 1980 o Dr. Siqueira (Z´L), então presidente da Sociedade Comunal Israelita, assumiu junto ao Departamento de Cemitérios da Prefeitura do Rio que o Comunal zelaria por Inhaúma, já que os sócios e sócias da Associação Beneficente Funerária e Religiosa Israelita estavam idosos e quase todos falecidos.
Nos últimos anos, contudo, o estado de abandono me fez várias vezes solicitar ao Departamento de Cemitérios a limpeza do local. Em fevereiro de 2007 fui impedida de entrar em Inhaúma. Constatei que o Cemitério estava trancado, algo que nunca ocorreu antes. Para tentar entender o que se passava, soube que a FIERJ apoiava uma iniciativa do Comunal de construir um muro separando as lápides existentes de um pequeno terreno ainda ocioso e que margeia a favela do Rato Molhado. Esse muro é para impor as normas judaicas de que prostitutas e suicidas são enterrados junto aos muros, demarcando sua exclusão. Para o Comunal, o muro tornaria aquele campo, um campo-santo. Como se ele já não o fosse. O terreno ocioso serviria para o enterro de quem não pode pagar por Vila Rosali, Vilar dos Telles, Nilópolis e/ou o Caju...
Por tudo que pesquisei sobre elas, não posso permitir que isso ocorra. Parias não! O estado de abandono, as lápides quebradas e sem identificação, pintadas de cal e violadas com colorjet preta chocam. E é para impedir que essa memória se apague, o decreto de tombamento.
O decreto de tombamento expõe, infelizmente, que mais uma vez falhamos nos nossos laços de solidariedade. Da mesma maneira que ouvi, tantas vezes, o relato de que senhoras iam aos portos avisar as moças do seu destino na prostituição, mas não lhes ofereciam outra opção; agora se recusam a zelar, de forma digna, pelo esforço descomunal de se manterem judeus apesar de tudo. Querem apagar suas memórias, misturando com outros enterros e descaracterizando aquele campo-santo!
Torço que a FIERJ e o Comunal venham à público anunciar o que a Chevra Kadish de São Paulo fez a quase 10 anos em Cubatão e no Butantã.
Um forte abraço
Beatriz Kushnir

segunda-feira, 24 de setembro de 2007

Cemitério Israelita de Inhaúma é tombado pela Prefeitura do Rio


Caros amigos,

O Decreto publicado no Diário Oficial do Município do RJ de hoje [24/9/2007] é a garantia legal que o Cemitério Israelita de Inhaúma será preservado de forma intacta. Não se farão alterações arquitetônicas, nem promoverão novos enterros sem a autorização expressa do Patrimônio Cultural da Prefeitura do Rio. O Cemitério Israelita de Inhaúma será resguardado enquanto o espaço de sepultamento dos sócios e sócias da Associação Beneficente Funerária e Religiosa Israelita – as famosas “polacas”.

Dói-me muito saber que não fomos capazes de resolver a questão internamente e que o poder público precisou agir. No último domingo, dia 16/9/2007, entre o Rosh Hashaná e Yom Kippur, os cemitérios judaicos pelo mundo recebem visitantes. Como faço há muitos anos, queria ir à Inhaúma acender velas e rezar um Kadish. O cemitério está trancado e preciso fazer um balé de negociações para garantir a minha entrada. Ninguém mais além de mim e de meus amigos foram até lá. Pessoas que desconhecem a história de quem está ali dizem se eu posso isso ou aquilo...

Assustei-me com o estado de abandono do lugar, das lápides pintadas com cal e numeradas com colorjet preta, mesmo que existam informações em sua base. Cresce o número de sepulturas sem identificação, mesmo que eu venha constantemente dizendo onde está o documento que recoloca as identidades nos túmulos...

Se Yom Kippur é uma permissão religiosa e cultural que nos concedemos para fazer um balanço de nossas vidas, expurgar nossos erros e zerar trajetórias, que esse Decreto, no primeiro dia útil depois de feriado sagrado seja encarado como a possibilidade de transformação. Kippur é um exercício de compaixão, de compartilhar o sentimento.

Que comecemos o ano de 5768 aprendendo com o exemplo da Chevra Kadisha de São Paulo, que restaurou e cuida do Cemitério Israelita de Cubatão e das lápides no Butantã. Que possamos finalmente dar uma resposta digna ao passado, não nos envergonhando dele e nem tentando, pelo abandono, destruí-lo. Recoloquemos as lápides de Inhaúma e tornemos aquele cemitério um lugar aprazível. Respeitemos o esforço descomunal dos que o fundaram e o mantiveram e, principalmente, dos 797 corpos ali sepultados.
Coloco-me, como sempre o fiz, à disposição para ajudar a realizar tal tarefa.
Um abraço
Beatriz Kushnir
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DECRETO N.º 28463 DE 21 DE SETEMBRO DE 2007

Determina o tombamento provisório do Cemitério Israelita de Inhaúma, situado na rua Piragibe, n.º 99, no bairro de Inhaúma.

O PREFEITO DA CIDADE DO RIO DE JANEIRO, no uso de suas atribuições legais e,

considerando a importância dos cemitérios como registro da evolução histórica e social da Cidade do Rio de Janeiro;

considerando que o Cemitério Israelita de Inhaúma é um marco particular no âmbito dos campos santos da Cidade do Rio de Janeiro;

considerando que a sua fundação em 1916, pela Associação Beneficente Funerária e Religiosa Israelita, representou um papel social relevante para uma parcela da população de imigrantes israelitas no país;

considerando que a permanência deste testemunho físico constituirá em um legado a ser perpetuado na memória da Cidade do Rio de Janeiro; e

considerando a necessidade de adotar medidas cautelares para a proteção do referido imóvel;

DECRETA

Art. 1.o Fica tombado provisoriamente, nos termos do Art. 5.o da Lei 166, de 27 de maio de 1980, o Cemitério Israelita de Inhaúma, situado na Rua Piragibe, n.º 99, no Bairro de Inhaúma.

Art. 2.o Quaisquer intervenções físicas a serem realizadas no referido imóvel deverão ser previamente aprovadas pelo Conselho Municipal de Proteção do Patrimônio Cultural do Rio de Janeiro.
Art. 3.o Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.
Rio de Janeiro, 21 de setembro de 2007 - 443o ano de fundação da cidade.

CESAR MAIA